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Publicado em 08 de dezembro de 2016 | 15 minutos de leitura

Calma !!!!

A Medida Provisória nº 746, de 22 de setembro de 2016, que veio dar ao injusto e desatualizado Ensino Médio brasileiro uma esperança de renovação e de modernidade, vem despertando dúvidas, angústias e preocupações em alguns educadores, estudantes e suas famílias. De forma açodada interpretaram essa MP 746/16 como arbitrária e intempestiva e, de repente, correntes de esquerda e de direita passaram, inacreditavelmente, a ter uma única voz. CONTRA! GOLPE! Sem uma análise mais profunda e coerente, até legisladores manifestaram-se CONTRA!

Assim, preocupadas com a possibilidade de um movimento que possa frear essa Medida Provisória que tem, no seu bojo, a possibilidade de dar aos nossos jovens um Ensino Médio afinado com os anseios da juventude e com os avanços tecnológicos que lhes são oferecidos, colocamos aqui as ponderações e a análise que sentimos falta nos textos e medidas que vieram criticar e, até mesmo, solicitar sua revogação.

A maior rejeição à essa Medida Provisória se deu, exatamente, por ser uma Medida Provisória. Só que muitos desconhecem que esse é um Projeto de Lei que se encontra, desde 2013, em tramitação no Congresso. Ela veio, portanto, de uma necessidade, uma medida de coragem para alavancar e impulsionar corações e mentes de educadores na busca de um Ensino Médio que não só atraia e leve o jovem a gostar de estudar, mas, também, o incentive a permanecer na Escola. O cenário atual nos mostra que metade da população, acima de 25 anos, ainda tem, apenas, o Ensino Fundamental completo e, apenas, uma pequena parcela conclui o Ensino Médio e outra, menor ainda, segue para a Universidade. É uma situação que tem urgência em ser revertida!

Dissemos, no início deste texto, que o nosso Ensino Médio é injusto e desatualizado. Sim, porque engessa os alunos no mesmo modelo, ou seja, todos têm que aprender quase que a mesma coisa, sobre muita coisa, independente de suas aptidões, seus interesses e seus sonhos pessoais e profissionais. Já em 1950, o americano Richard Feyman, Prêmio Nobel de Física, observou que “nunca vira um currículo tão extenso e jovens que sabiam tão pouco”! Em 2016, portanto 66 anos depois, permanecemos iguais – ou piores – completamente desconectados com a realidade!

A ideia de que todos têm que aprender a mesma coisa, o que de longe pode sugerir inclusão, promove é a desigualdade, a exclusão social, nas palavras de Rafael Lucchesi, Diretor do SENAI e membro do CNE, pois, uma boa parte de estudantes não conclui o Ensino Médio, fica pelo caminho, perdendo a chance de atingir o que ambicionaram para seu futuro. Um jovem que tem gosto pelas Ciências Humanas é obrigado a penetrar nos conteúdos da Física, da Química e da Biologia, outro que quer seguir Medicina, tem que conhecer todos os meandros da Geografia, da História, da Sociologia, sem distinção da carreira profissional que escolheram. E haja conteúdo!

Um excesso de informação, de objetivos, que não deveriam fazer parte dos componentes curriculares do Ensino Médio, mas sim, das respectivas graduações. No Brasil, 17% dos jovens vão para a Universidade, mas 83% não vão. E como se dá o ingresso daquele que quer entrar no mundo do trabalho? O Estado dá a ele condições, através de bons cursos, para o ingresso na carreira técnica? E, ainda, segundo Rafael Lucchesi: “Será que não dá para conviver com um bloco de criticidade na Base, e trilhas opcionais, que permitam que 83% dos jovens que não vão para a universidade  tenham direito a ter uma identidade social conferida pelo sistema educacional?

O que o novo Ensino Médio propõe é a possibilidade de o aluno escolher seu próprio caminho: a vida acadêmica, caso queira seguir uma Universidade, ou o ensino técnico, se precisar, ou quiser, entrar para o mercado de trabalho. A decisão será dele, através do sistema de disciplinas eletivas, a exemplo do que ocorre em países como Inglaterra, Canadá e Estados Unidos. Ele será o protagonista de sua vida acadêmica ou profissional, dependendo de sua própria escolha.

Uma comissão, formada por senadores e deputados aprovou, no dia 30/11 do corrente mês, mudanças nessa Medida Provisória que reforma o Ensino Médio. No entanto, essas mudanças não alteraram a forma e o tratamento que se pretende dar a ele.

Como isso se dará?

Hora-aula:

O Ensino Médio, hoje, tem 2.400 horas, distribuídas em três anos letivos, ou seja, mínimo de 800 horas aula, ministradas em, no mínimo, 200 dias letivos. A primeira versão da reforma pretendia que o Ensino Médio passasse a ter 1.400 horas anuais, sendo 1.200 horas na primeira metade do curso, quando a Base Nacional Comum é prevalente e igual para todos, e o restante da carga horária, na etapa final do curso, completando 4.200 horas.

Quanto aos questionamentos a esse aumento de carga horária, pesquisas já nos indicaram que muitas escolas já oferecem 1.200 horas anuais, portanto, 7 horas diárias. E, ainda, essas 1.400 horas anuais, propostas pela MP 746/16, serão implementadas gradativamente. E mais, a obrigatoriedade dessa carga horária para algumas escolas da rede pública, não contempla, definitivamente, a rede particular.

Grifamos algumas porque a Portaria Ministerial nº 1145/16, que “Institui o Programa de Fomento à Implementação de Escolas em Tempo Integral” para o Ensino Médio, define como se dará essa adesão ao programa mostrando, assim, a forma gradual de como será essa implantação, também, na escola pública. Não custa lembrar que Darcy Ribeiro, quando idealizou os CIEPS para o Rio de Janeiro, tinha como objetivo principal o horário integral, como ele dizia, a saída para salvar os jovens de tenebrosas tentações. Os erros, ou as falhas cometidas, nos servem de exemplo para uma nova tentativa.

Uma das mudanças aprovadas, em 30/11, está na carga horária que passou a exigir 1000 horas anuais, em lugar das 800 horas atuais, e das 1400 horas, em princípio estabelecidas, oferecendo, ainda, às escolas, um tempo de cinco anos para atender a essa determinação.

 

Componentes Curriculares:

Temos hoje, na Matriz Curricular, treze disciplinas obrigatórias, alocadas na Base Nacional Comum, outras na Parte Diversificada do Currículo e, ainda, os Temas Transversais, impostos por Leis Federais (algumas alteraram a própria LDB), Estaduais ou Municipais, o que torna o currículo a ser cumprido pelo estudante cansativo e, para alguns, desnecessário.

O que se pretende agora é a flexibilização desse currículo, ou seja, durante a primeira metade do Ensino Médio os componentes curriculares ministrados serão iguais para todos, dentro das áreas do conhecimento, a saber: Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Formação Técnica e Profissional com, no máximo, 1200 horas anuais. Na outra metade, os alunos irão, de acordo com sua aptidão, ou necessidade, escolher as disciplinas que irão cursar, dentro das mesmas áreas do conhecimento.

A alteração apresentada estabelece que a Base Nacional Comum deverá ocupar sessenta por cento da grade, e os demais 40% ficarão a escolha  do aluno, dentro das cinco áreas acima descritas.

Alguns críticos dessa MP nº 746/16 temem o empobrecimento do currículo. Eles dizem que atingirá, principalmente, a parcela economicamente menos favorecida da sociedade e que, normalmente, frequenta a escola pública. Podemos rebater tal temor com um exemplo e uma constatação. O exemplo é o da Finlândia, país com altos índices de aprovação no ranking de educação internacional. Lá são ministradas, obrigatoriamente, dezoito disciplinas, mas com tal flexibilidade e com estratégias metodológicas tão bem definidas e aplicadas que, em um ano e meio, o aluno pode vencê-las e, no restante seguinte do curso, construir seu próprio currículo.  A constatação, a que nos referimos, está na Portaria Ministerial nº 1.445/16, cuja leitura e análise demonstram que essa reforma do Ensino Médio é um projeto muito mais voltado para a Escola Pública, um investimento que atraia os alunos para permanecerem na Escola, o que hoje, absolutamente, não acontece.

A outra grande crítica em relação a essa condensação da grade curricular refere-se à retirada da obrigatoriedade de algumas disciplinas, como Arte e Educação Física. É preciso ficar claro que na parte fixa do Ensino Médio, ou seja, na primeira metade, além de Português, Matemática e Inglês que estarão sempre e, obrigatoriamente, presentes em todo o Ensino Médio, elas permanecem, como podem permanecer todas as treze disciplinas, hoje obrigatórias, embora, e isso é muito inovador e estimulante, a forma de ensinar possa ser diferente do modelo tradicional. As matérias não precisarão ser ministradas de forma estanque, separadas por professor e carga horária independente. Poderão ser ensinadas de maneira multidisciplinar ou interdisciplinar. E na outra parte do Ensino Médio, no ano e meio seguinte, que será o tempo de liberdade do aluno, em que ele será o protagonista na construção de seu currículo, essas disciplinas, e ainda, por exemplo, Sociologia e Filosofia, constituirão os Itinerários Formativos. O que são eles?

 

Itinerários Formativos Específicos

São os componentes curriculares que comporão a segunda metade do Ensino Médio, juntamente com Português, Matemática e Inglês, sempre presentes. Esses itinerários formativos específicos serão definidos pelos sistemas de ensino, de acordo com as cinco áreas do conhecimento ou de atuação profissional: Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Formação Técnica e Profissional. Então, as disciplinas poderão ficar assim contempladas:

Linguagens: Português e Inglês, obrigatórias, e/ou outra Língua Estrangeira, preferentemente, o Espanhol, a escolha do sistema ou da instituição, Arte incluindo Música e os demais temas transversais ligados a essa área e Educação Física. A alteração, agora introduzida, torna a colocar, como obrigatórias, Arte e Educação Física.

Matemática: Matemática, obrigatória, e, por exemplo, Geometria, Desenho.

Ciências da Natureza: Física, Química, Biologia com o aprofundamento a critério do aluno.

Ciências Humanas: História, Geografia, Sociologia, Filosofia, Ensino Religioso, a escolha do aluno.

Na Formação Técnica e Profissional, o texto aprovado pela Comissão ratifica a possibilidade de profissionais, com notório saber, sem formação pedagógica, lecionarem nos cursos profissionalizantes.

Um sistema de ensino, ou uma instituição terão a possibilidade de compor o seu currículo, na parte final do Ensino Médio, com base em uma ou em mais áreas de conhecimento. O estudante poderá, ainda, a seu critério, cursar outro itinerário formativo, após a conclusão do Ensino Médio.

A matrícula poderá, também, por decisão da instituição de ensino, ser adotada de formas diversas, anual, semestral, por disciplina, por crédito, variando de escola para escola. Tudo irá depender do que estiver contido no Projeto Político Pedagógico e no Regimento Escolar. E é através desses documentos, principalmente, do Projeto Político Pedagógico – que deve exprimir a sua missão, sua filosofia e seu comprometimento com a formação do educando – que os pais escolherão a escola de seu filho.

Outro aspecto a ser observado, refere-se à vinculação dessa nova visão do Ensino Médio com os anos finais do Ensino Fundamental. Como o Ensino Médio representa a última etapa da Educação Básica e o qual, de acordo com as finalidades contidas na LDB, deve consolidar e aprofundar os conhecimentos adquiridos pelos alunos no Ensino Fundamental, preparando-os para o trabalho, para o exercício da cidadania, para o seu aprimoramento como pessoa humana, desenvolvendo seu sentido crítico, sua noção de ética, de autonomia intelectual, de compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática no ensino de cada disciplina, o aluno, nos anos finais do Ensino Fundamental, já deve começar a ser preparado para o novo papel que desempenhará no Ensino Médio, o de construtor de seu currículo e de seu destino, acadêmico ou profissional.

O ENEM, o bicho papão de gestores, educadores e alunos, precisará e será, segundo seus criadores, como Maria Inês Fini, modificado e ajustado ao novo Ensino Médio. Já existem propostas que vêm ao encontro do que ocorre em outros países. As únicas disciplinas que farão parte de sua avaliação serão Português e Matemática. Isso, sim, dá um caráter de hegemonia e de oferecimento de oportunidades iguais para todos os alunos, do Oiapoque ao Chuí.

Sabemos que não se trata de uma mudança trivial, ao contrário, exige um profundo mergulho em estudos, em análises de experiências bem sucedidas, na organização e participação em debates, seminários e congressos que envolvam educadores e especialistas que transitem nas diferentes esferas e redes de ensino do país, e fora dele, para que um novo Ensino Médio surja de acordo com os nossos anseios, necessidades, enfim, com a cara do nosso País e do nosso povo.

Lembramos, ainda, que para entrar em vigor, a MP precisa ter a aprovação do Congresso Nacional, ser transformada em Lei, depois ser regulamentada pelo Conselho Nacional de Educação, através de Resoluções e Pareceres, pelos Conselhos Estaduais de Educação, esperar a Base Nacional Comum ser aprovada, uma vez que uma não existe sem a outra, o que demandará tempo suficiente para que escolas, gestores, educadores, alunos e a sociedade analisem, reflitam e se preparem, suficientemente, para algo melhor que, indiscutivelmente, virá.

A última mudança no texto, aprovado na Comissão em 30/11, seguirá para o Plenário da Câmara e, depois, para o Plenário do Senado, um processo que deve se alongar, no mínimo, até meados de março de 2017.

Assim, e por tudo isso, CALMA!!!!!

Olívia Cândida Martins Mansur e Sylvia Beatriz dos Santos Menezes

  • Professoras e Assessoras Pedagógicas do SINEPE RIO

 

 




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