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Publicado em 06 de março de 2012 | 4 minutos de leitura

Dicionário “Houaiss” resistirá a patrulhamento, diz coautor

Diretor do IAH afirma que obra não deve ser palco de batalhas ideológicas e que irá à Justiça para fazer o livro cumprir seu papel: registrar usos da língua

Nathalia Goulart

O dicionário Houaiss vai resistir ao assédio das patrulhas ideológicas. Isso é o que garante Mauro Villar, diretor do Instuto Antônio Houaiss, que edita a obra. Na prática isso significa que o IAH pretende recorrer de eventual decisão judicial que o obrigue a apagar do volume acepções pejorativas de verbetes como cigano. Pode parecer absurdo. Mas, de fato, na semana passada, o Ministério Público Federal (MPF) em Minas Gerais entrou com uma ação na Justiça pedindo que sejam recolhidos os exemplares do dicionário porque o tal verbete explica que a palavra cigano pode assumir significados – insultuosos, bem destaca a obra – como “trapaceiro, velhaco, burlador”. Isso, na visão embaralhada do MPF, ajuda a disseminar o preconceito contra os ciganos e a intolerância étnica. “Nos solidarizamos com todos os grupos que se sentem vítima de preconceito e discriminação, mas entendo que os dicionários não são palco para lutas dessa natureza”, diz Villar. “Caso ela (a juíza que analisa o caso) decida acatar o pedido do MPF, acionaremos nossos advogados a iremos defender nossa posição na Justiça.” Leia a seguir a entrevista que ele concedeu a VEJA.

Qual a posição do IAH diante da ação do MPF em Minas Gerais? Em 2010, recebemos uma notificação por intermédio da Editora Objetiva, que publica nosso dicionário. Analisamos a situação e enviamos à editora uma resposta formal, explicando nossa posição de manter o verbete cigano exatamente como está.

O que pesou na decisão? Não vemos razão para qualquer tipo de supressão. Nos solidarizamos com todos os grupos que se sentem vítimas de preconceito e discriminação, mas entendo que os dicionários não são palco para lutas dessa natureza. Dicionários são um espelho da sociedade. Tudo o que existe de bom e de ruim deve estar registrado ali. Nada pode ir para debaixo do tapete. Tudo o que é pejorativo ou mesmo agressivo precisa estar ali, devidamente esclarecido. É como fazem os dicionários modernos em todo o mundo.

Os verbetes cigano e negro foram retirados da versão on-line do Houaiss. Essa decisão partiu do senhor? Não. Foi uma decisão tomada dentro do Instituto enquanto eu estava fora do país, na semana passada. Assim que retornei, solicitei que fossem inseridos novamente os verbetes. Não vejo sentido nenhum nessa retirada.

O IAH, em parceira com a Objetiva, já prepara uma nova edição do dicionário. Ela trará mudanças? Era uma mudança já prevista. Não haverá alterações nas acepções. No entanto, haverá uma observação nos usos pejorativos, com explicações mais aprofundadas e o objetivo de contextualizar determinados usos.

E quanto ao andamento do processo na Justiça? A notícia que tenho é que a juíza da Justiça Federal de Uberlândia está analisando a ação. Caso ela decida acatar o pedido do MPF, acionaremos nossos advogados a iremos defender nossa posição na Justiça

 

Fonte: Revista Veja – 5/3/2012


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