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Publicado em 16 de julho de 2012 | 10 minutos de leitura

É importante a observação da sala de aula”, diz Thomas Kane

A análise do desempenho dos alunos em testes deve ser uma das ferramentas usadas para avaliar a eficácia dos professores, mesmo que fatores externos à sala de aula influenciem os resultados dos estudantes. Esta é a opinião do diretor do Centro de Pesquisas em Políticas Educacionais de Harvard e vice-diretor da área de Educação da Fundação Bill & Melinda Gates, Thomas Kane. Mas ele ressalta: não basta olhar as conquistas dos alunos nos exames para saber sobre a eficiência dos profissionais de Educação. Coordenado por Kane, o projeto Medições de um Ensino Eficiente, da Fundação Bill & Melinda Gates, analisa o trabalho de três mil professores nos Estados Unidos usando também a observação da atuação deles em sala de aula e pesquisas com alunos.

O relatório final do projeto ficará pronto em 2013, mas alguns resultados já foram divulgados. A pesquisa mostrou que professores que, no passado, tiveram alunos com ganhos de desempenho em testes anuais provavelmente terão, no futuro, alunos que melhorarão seu desempenho. E revelou que perguntar aos estudantes sobre seus professores e colocar observadores dentro de sala de aula são ferramentas úteis para saber mais sobre como os docentes podem melhorar.

Kane, que ministrou palestra na semana passada em São Paulo a convite da Fundação Lemann, Fundação Brava e Instituto Fernando Henrique Cardoso, diz que é preciso avaliar se o pagamento de bônus em dinheiro a professores realmente resulta na melhoria da aprendizagem.

GLOBO: Quão difícil é avaliar um professor?

THOMAS KANE: Ensinar, assim como aprender, é muito complexo. E, como consequência disso, o ensino precisa ser medido de múltiplas maneiras. No projeto Medições de um Ensino Eficiente, que a Fundação Bill e Melinda Gates financia, nós medimos a eficiência dos professores de várias formas. Olhamos para as melhorias apresentadas pelos alunos, pedimos para os estudantes nos dizerem o que pensam dos professores, observamos os professores ensinando em sala e aplicamos testes que avaliam o conhecimento dos professores sobre o conteúdo. Apenas quando você combina essas diferentes abordagens é que consegue saber, de forma precisa e justa, o trabalho que os professores estão fazendo.

GLOBO: Mas há uma forma de avaliar que seja mais importante que as outras?

KANE: Não sei se existe uma ferramenta mais importante, mas posso dizer que, se alguma delas não fosse eficiente, não seria valiosa para o projeto. O fundamental é saber se essas ferramentas vão ajudar a identificar os professores que farão com que os alunos aprendam melhor no ano que vem e nos próximos anos. Quando se fala em identificar os professores que terão estudantes com grandes conquistas no futuro, a melhor maneira é saber se eles (professores) já tiveram, no passado, alunos que apresentaram melhoras.

GLOBO: Como usar resultados de alunos em exames para avaliar professores?

KANE: Nos Estados Unidos, da terceira à oitava séries, estudantes fazem testes no final de todos os anos. Com esse teste anual você pode ver dentre os alunos que frequentaram as aulas na sala de um professor, quão bem eles se saíram no final do ano anterior. E o quanto eles conseguiram crescer em termos de conquistas alcançadas neste ano. Há duas coisas importantes. Primeiro: ser capaz de medir as melhorias alcançadas pelos alunos ao longo do tempo, usando os dados dos testes anuais. Segundo: ter dados precisos sobre quais alunos estão frequentando as aulas de professores específicos. Se você tem essas duas coisas, você pode medir a melhora dos alunos.

GLOBO:É preciso avaliar os alunos no início do ano e no final do ano e não apenas no final do ano?

KANE: Sim. O que você quer é focar no crescimento das conquistas alcançadas pelos alunos e não apenas no que eles alcançaram no final do ano. As realizações deles vão depender de como eles estavam quando começaram o ano.

GLOBO:Alguns críticos dizem que estudantes têm experiências diferentes fora da sala de aula e que os resultados deles em exames não refletem diretamente o trabalho do professor…

KANE: Isso é verdade. Há fatores fora da sala de aula que afetam os resultados dos alunos. É como um goleiro. Há várias coisas que afetam o número de gols marcados, como a qualidade do time adversário e os zagueiros do time. Mas a habilidade do goleiro será um fator muito importante sobre quantos gols foram marcados, apesar de não ser o único fator. E, no ensino, há outras coisas que influenciarão as melhoras apresentadas pelos alunos ao longo do ano. Por isso, é importante medir mais do que apenas as conquistas dos alunos. No entanto, vimos que o professor, individualmente, tem sim um grande impacto nestas conquistas.

GLOBO: Algumas pessoas dizem que, se os professores forem avaliados com base nos resultados dos alunos, eles não darão muita atenção a estudantes que têm mais dificuldade em aprender. O senhor concorda?

KANE: Por isso é que é importante focar no crescimento. Se você mede as mudanças nas conquistas dos alunos, e não apenas a performance deles no final do ano, então, essa é uma maneira de conseguir encorajar professores a prestarem atenção a todos os alunos numa sala, e não apenas nos alunos que têm resultados bons nos exames.

GLOBO: O senhor acredita que os professores tendem a treinar os alunos apenas a passar nos testes e a responder perguntas de múltipla escolha?

KANE: Isso é um perigo real. E, por isso, é importante avaliar os professores por meio de outras ferramentas que não apenas os resultados dos exames. É importante ter a observação da sala de aula e saber o que os alunos pensam dos professores. Aprendemos que se você perguntar aos alunos questões como “Quando você devolve seu dever de casa, você recebe um retorno útil do professor que vai ajudar você a melhorar?” ou “Você acha que o professor usa bem o tempo na aula?”, os alunos podem ajudar a identificar os professores com quem eles estão aprendendo mais.

GLOBO: As respostas dos alunos sobre os professores surpreenderam?

KANE: Uma das coisas que nos surpreendeu foi que o grau das respostas dos alunos parecia ser similar para o mesmo professor.

GLOBO: Pagar bônus a professores para estimulá-los a melhorar é uma boa medida?

KANE: Sabemos que existem grandes diferenças entre as melhorias apresentadas pelos alunos com diferentes professores. O importante é saber a origem dessas diferenças. Elas são causadas pelo esforço de cada professor, como se um trabalhasse mais que o outro? Ou elas são causadas pelo talento e habilidades adquiridas? Se você achar que elas se devem ao esforço, você tem que dar incentivos financeiros com base nos resultados de testes e em outros fatores. Mas se você acredita que as diferenças são causadas pelo talento e pelas habilidades, é preciso identificar de maneira mais cuidadosa quem são os professores mais eficientes, logo no início da carreira deles. No Estados Unidos, eu acredito que o problema não é o esforço. Para mim, os professores fazem o melhor trabalho que sabem fazer, mas não têm as habilidades que precisam para fazer com que os alunos aprendam. Nesse caso, os incentivos financeiros não vão fazer diferença nos resultados. Seria interessante pesquisar isso no Brasil, ou seja, saber se dar incentivos financeiros aos professores implica em uma melhora nos resultados dos alunos.

GLOBO: Os governos se preocupam o suficiente com a necessidade de avaliar os professores?

KANE: Atualmente, vários estados dos Estados Unidos estão tentando reinventar a maneira como avaliam os professores e como informam os professores sobre seus resultados. No passado, eles realmente não se preocupavam o suficiente. Para jovens professores no início de suas carreiras é especialmente importante saber como estão indo.

GLOBO: Por que é especialmente importante para professores em início de carreira?

KANE: Este é o período em que as pessoas estão formando seus hábitos, desenvolvendo uma maneira de ensinar e em que elas estão mais abertas a sugestões. Além disso, este é período em que é possível tomar decisões sobre quais professores devem ser mantidos e quais não devem ser mantidos. Nos Estados Unidos, essa decisão sobre quem é eficiente ou não pode ser tomada nos dois ou três primeiros anos da carreira dos professores.

GLOBO: Professores com resultados ruins deveriam ser demitidos?

KANE: Acho que deveríamos ter cuidado para que apenas os professores mais eficientes fossem efetivados após o período de estágio probatório.

GLOBO: Avaliar professores é algo muito caro?

KANE: Medir as melhorias de aprendizagem apresentadas pelos alunos e fazer pesquisas com estudantes não é tão dispendioso. A parte que custa mais dinheiro é ter um adulto para observar o trabalho do professor em sala de aula. Sei que o custo da mão de obra é diferente no Brasil e nos Estados Unidos. Mas, nos Estados Unidos, os órgãos governamentais que estão fazendo um bom trabalho na avaliação de professores estão gastando 2% da folha de pagamento no sistema de medição. Investir esse valor é investir em algo valioso e importante. Muitos órgãos educacionais nos Estados Unidos gastam dinheiro em atividades de treinamento que, muitas vezes, não terão tanto impacto na melhoria do aprendizado dos alunos. Fazer uma avaliação bem feita dos professores custa dinheiro, mas é uma das melhores maneiras de gastar o dinheiro.

Fonte: O Globo – 16.07/2012




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