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Publicado em 09 de dezembro de 2014 | 6 minutos de leitura

Maioria dos pais não segue vida escolar dos filhos

JÔNATAS DIAS LIMA, ENVIADO ESPECIAl

A maior parte das famílias brasileiras com crianças e adolescentes em casa valoriza o afeto, mas deixa a educação em segundo plano no ranking de prioridades. Essa é uma das constatações da pesquisa Atitudes pela Educação, realizada pelo Ibope a pedido de um conjunto de fundações e institutos dedicados ao desenvolvimento educacional no país. O estudo, publicado neste mês, mostra que 27% dos pais entrevistados dialogam frequentemente com os filhos, mas não acompanham com afinco a rotina escolar.

Escolaridade

A maior parte (33%) dos pais de alunos em idade escolar tem ensino médio completo, mostrou a pesquisa do Ibope. O resultado é bastante diferente quando se compara com a escolaridade dos avós dos atuais estudantes de 4 a 17 anos. Um terço dos responsáveis por alunos têm pais com ensino fundamental incompleto e 24% são filhos de pais e mães sem escolaridade.

O objetivo do levantamento foi identificar e dimensionar as atitudes das famílias que afetam diretamente a relação das crianças e jovens com a escola. O estudo ouviu 2.002 pais de estudantes de 4 a 17 anos das redes pública e privada de todas as regiões do país. Para determinar os resultados foram estipuladas duas dimensões de comportamento: a valorização da educação escolar pelo adulto e o vínculo do adulto com a criança ou jovem.

Segundo Alejandra Meraz Velasco, coordenadora do movimento Todos Pela Educação, uma das entidades promotoras da pesquisa, são consideradas formas de valorização da educação escolar atitudes práticas, como levar o filho à escola, ir às reuniões de pais, conversar com os professores e checar a lição de casa. Como vínculo, foram considerados comportamentos afetivos, como dialogar com frequência sobre opiniões e preferências ou passar momentos juntos.

O resultado mostra que 19% dos pais foram classificados como distantes por estarem alheios ao ambiente escolar vivenciado pelo filho, além de serem ausentes no que diz respeito ao afeto. No outro extremo, 12% dos pais são comprometidos, ou seja, acompanham o desempenho dos filhos na escola, comparecem às atividades escolares e têm relação próxima com crianças e jovens pelos quais são responsáveis.

Vinculados

A maior parte dos entrevistados (27%), no entanto, enquadra-se na categoria “pais vinculados”, ou seja, valoriza o comportamento afetivo, mas dedica pouca atenção ao desenvolvimento dos filhos na escola. Os números mostram que 95% dos vinculados dizem estar presentes nos momentos mais importantes da vida da criança; mas apenas 44% acompanham o calendário de provas e somente 20% conversam com outros pais sobre a qualidade da escola.

Apresentando porcentual semelhante (25%) está o grupo dos envolvidos, caracterizados como aqueles que praticam mais ações de valorização da educação do que de vínculo afetivo. Entre os pais desse grupo, 87% acreditam que, se a criança estudar, terá uma vida melhor que a deles, e 79% conferem se o filho estudou para as provas. Mas apenas 35% fazem programas culturais com os filhos, por exemplo.

Os dados foram apresentados no 4.º Simpósio Internacional de Desenvolvimento da Primeira Infância, promovido pelo Núcleo Ciência pela Infância nos dias 12 e 13 de novembro, em São Paulo. A iniciativa surgiu de uma parceria entre o movimento Todos Pela Educação, Fundação Itaú Social, Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, Fundação Roberto Marinho, Instituto C&A e Instituto Unibanco.

Análise

País progride em saúde infantil, mas patina na educação

Para o economista Norbert Schady, chefe do Setor Social do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o Brasil acompanhou a evolução também verificada em vários países da América Latina na última década nos cuidados com a primeira infância, mas o desenvolvimento educacional deixou a desejar.

“Houve progresso no estado nutricional, na saúde infantil, na mortalidade infantil, no acesso à água potável, mas não se constata o mesmo avanço em outras áreas, como na educação, e, às vezes, isso se deve à falta de dados”, diz o economista, que foi um dos palestrantes no 4.º Simpósio Internacional de Desenvolvimento da Primeira Infância. Ele lamenta, por exemplo, a ausência de números comparáveis no que diz respeito ao desenvolvimento cognitivo das crianças de 0 a 3 anos, o que poderia ser mensurado pelo domínio linguístico na idade certa, algo como a quantidade de palavras que compõem o vocabulário da criança em cada faixa etária.

Na avaliação de Schady, parte da dificuldade em progredir na questão educacional se deve ao fato de que muitos problemas na área têm sua raiz em questões comportamentais, e mais investimentos nem sempre são eficazes para mudar hábitos. “Acho inclusive que governos ou a comunidade científica não são muito humildes nesse ponto. Apresentam-se soluções técnicas como se fosse algo óbvio, mas a verdade é que é muito difícil mudar comportamentos”, diz Schady, ao mencionar a importância da dedicação dos pais no desenvolvimento de uma criança.

Creches

Segundo Schady, um exemplo de como o aumento de investimentos nem sempre proporciona melhora efetiva na educação das crianças está no aumento no número de creches no Brasil, as quais o economista considera pouco relevantes ao desenvolvimento infantil, devido à baixa qualidade. “Não há razões para acreditar que o simples fato de se colocar uma criança numa creche seja o melhor para ela. Tudo depende do que se faz em sala de aula, e o que vemos até agora é que a qualidade das creches é muito, muito baixa.”

 Fonte: Gazeta do Povo – 7/12/2014 




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