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Publicado em 20 de maio de 2015 | 5 minutos de leitura

Nova regra do Enem frustra estudantes mas é apoiada por especialistas

O novo edital do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) já deixa uma lição bem clara para os futuros candidatos: não há atalho para a faculdade. Entre as novas medidas adotadas, a que mais despertou atenção foi a proibição de que menores de idade não-concluintes do ensino médio utilizem o seu resultado para garantir o certificado do segmento ou para pleitear uma vaga no ensino superior. Um dia depois do anúncio, a medida divide opiniões entre especialistas, alunos que já utilizaram a brecha e os que contavam com ela para este ano.

O caso de José Victor Menezes Teles ganhou notoriedade no ano passado, mas, com as novas regras, não deverá se repetir. Aos 14 anos, o sergipano conseguiu nota suficiente para ser aprovado no curso de Medicina da Universidade Federal de Sergipe (UFS) por meio do Sistema de Seleção Unificado (Sisu). O jovem, que começará o curso em agosto, reprovou a decisão do Ministério da Educação (MEC).

— Achei um retrocesso, porque a própria Constituição diz que a educação deve ser dada de acordo com a capacidade de cada um. Muitas vezes me julgam erroneamente. Não sou um gênio. Gênio é quem não estuda, e eu estudei muito. Quando me chamam assim, desvalorizam o meu esforço — afirma José Victor, que, no 1º ano do ensino médio num colégio público de Sergipe, procurou estudar conteúdos de anos posteriores para fazer o exame.

Quando perguntado sobre como pode um garoto transitar pelo ambiente universitário, José Victor não vê problemas ou possíveis dificuldades:

— Muitos dizem que não vou ter maturidade ou não vou conseguir me adaptar. Mas isso não é uma questão de idade. Quantas pessoas mais velhas, de 19 anos por exemplo, estão na universidade e não têm maturidade para estar lá?

Andrea Ramal, especialista em educação, concorda que a idade não define as condições para estar em diferentes ambientes educacionais, porém afirma que antecipar as etapas pode ser prejudicial na formação dos estudantes.

— Concordo com a intenção do MEC. O Enem mede algumas competências, outras não. A autonomia, a capacidade de relacionamento interpessoal e outras habilidades emocionais são desenvolvidas em um processo mais extenso. Algumas interrupções nesse desenrolar podem trazer prejuízos.

PULAR ETAPA PODE SER UM PROBLEMA

A especialista afirma que o ensino médio não é somente uma etapa para passar no vestibular ou no Enem.

— O treinamento que o estudante recebe no colégio não se restringe a exercitar-se para uma prova. Não é só acadêmico. O ambiente universitário tem uma linguagem mais abstrata, textos mais longos e uma necessidade de autonomia maior que precisa ser trabalhada aos poucos, ainda na escola — diz Andrea.

Apesar de saber que poderia ter dificuldade em algumas dessas habilidades quando fosse entrar na faculdade, Eduardo Marinho, aluno do 2º ano do ensino médio do Colégio Pensi, estava disposto a arriscar este ano.

— Já fiz algumas provas e tirei notas boas. Acredito que poderia conseguir o suficiente para passar no curso de Direito — afirma Eduardo.

Obstinado, o estudante de 16 anos acredita que a nova medida retardará seu planos de ser juiz federal.

— Fiquei triste com a decisão. Para mim, será como atrasar um ano, porque já penso no tempo que vou demorar para me formar na faculdade e prestar um concurso para ser juiz — comenta Eduardo.

Para a psicopedagoga Maria Amélia dos Santos, do grupo de estudos sobre educação básica da UFRJ, a decisão do MEC é importante, pois estipula marcos fixos e evita uma ansiedade precoce nos alunos.

— Quando você tem brechas como essa, há uma sensação de corrida entre os estudantes. Como se um, por ter entrado antes, já estivesse na frente. Mas a vida não é assim. Uma pessoa que entrou antes pode demorar mais tempo para terminar a universidade ou para conseguir se inserir no mercado trabalho. Não há receita de bolo — analisa Maria Amélia.

Ainda assim, a psicopedagoga acredita que a melhor solução é evitar “previsíveis frustrações”:

— Cada um tem o seu tempo, mas vivemos em sociedade. Nenhuma sala de aula apresenta alunos na mesma etapa do aprendizado. Cada um está mais à frente em uma habilidade diferente do outro. E é esta troca que traz a melhor formação.

Fonte: O Globo – 20/05/2015




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