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Publicado em 22 de agosto de 2017 | 8 minutos de leitura

O “cérebro pandêmico” e a “grande renúncia”: gestão, pessoas e propósito

 Amaro França

As empresas, as organizações e as próprias instituições de ensino, enquanto organismos vivos, vão construindo caminhos, alternativas e soluções para, cada vez mais, entregarem seus “produtos e serviços” à sociedade e, assim, possam continuar em crescimento, mantendo-se perene enquanto organizações. Para que esse objetivo aconteça, são constituídos modelos e processos de funcionamento nas diversas estruturas que compõem a organização, como os próprios modelos adotados nos processos de gestão de pessoas e o potencial desenvolvimento dos profissionais que integram a referida organização. Dessa forma, a autora Heloías Lück, aponta que a gestão educacional “é indicada como um processo pelo qual se mobiliza e coordena o talento humano coletivamente organizado, de modo que as pessoas em equipe possam promover resultados desejados.”.

Fato é que dentre as inúmeras questões que atingiram a educação e os processos de gestão educacional nessa pandemia, está a constatação que, depois de tanto tempo afastados do ambiente escolar, uma série de (re)aprendizagens por parte de alunos e, também de profissionais da educação, estão sendo necessárias – pois essas, são fundamentais para os educadores e, inclusive também, para o bem-estar emocional dos alunos e a aquisição de outras aprendizagens cognitivas mais elaboradas desses.

Recentemente, pesquisadores da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, têm sistematizado resultados de trabalhos e pesquisas acerca dos efeitos em nosso cérebro – devido ao longo tempo de isolamento social e da ansiedade gerada durante o período pandêmico. Numa entrevista concedida a uma rede de TV, a pesquisadora e neuropsicóloga Barbara Sahakian afirmou que: “Por meio de exames de imagem de pessoas socialmente isoladas, detectamos mudanças no volume das regiões temporal, frontal, occipital e subcortical, assim como no hipocampo e na amígdala.” São efeitos que atingem o nosso dia a dia, como esquecimento de coisas rotineiras, ou uma espécie de “névoa cerebral” quando diante de decisões que você costuma tomar com facilidade; esses efeitos atingem a nossa capacidade de memória ou de concentração – tão essenciais aos desenvolvimentos de aprendizagens. Segundo a própria pesquisadora e, também, o neurocientista Michael Yassa do Centro de Neurobiologia da Aprendizagem e Memória da Califórnia, esses fenômenos foram identificados quando pessoas eram expostas a níveis de estresse elevados: “Já no passado, níveis elevados e prolongados de cortisol foram associados a transtornos de humor e encolhimento do hipocampo. Isso é observado especialmente em pacientes com depressão… O hipocampo é a área do cérebro responsável por implementar essa memória, justamente uma das áreas mais afetadas pelos efeitos da pandemia.”

A esse conjunto de problemas que vêm atingindo principalmente à asúde mental das pessoas, os pesquisadores têm cognominado de cérebro pandêmico. Os cientistas afirmam ainda que, o fenômeno “cérebro pandêmico” varia de pessoa para pessoa, considerando principalmente, o elemento da resiliência individual e o nível de estresse ao qual cada pessoa foi submetida. Dessa forma, as respostas individuais diante do fenômeno vão apontar para os prováveis níveis de recuperação. Por isso, se faz necessário que, nos diversos ambientes como em casa ou nos ambientes escolares, as pessoas/os alunos devem ser estimulados à elaboração de rotinas, como por exemplo: levantar e arrumar a cama, se alimentar, fazer exercício físico e estudar sempre considerando os mesmos horários. É importante, também, adotar de forma individual ou coletiva na escola, a utilização de técnicas que visem estimular as funções cognitivas, como jogos de memórias, jogos colaborativos e aprendizagens de coisas novas. Essas recomendações apontam para uma chance melhor de recuperação do cérebro.

Outro fenômeno do “pós-pandemia” que vem ganhando proporção, em meio às organizações, tem seu termo cunhado pelo psicólogo e professor americano da Universidade Texas A&M – Anthony Klotz, fenômeno intitulado de: The Great Resignation. No Brasil, esse movimento começa a ser conhecido como: “Grande Renúncia” – que em síntese é uma onda, movimento de demissões voluntárias desde o início da covid-19 que começou nos Estados Unidos, mas vêm se espalhando em vários países do mundo. A Prof. Tatiana Iwai, doutora em administração e professora do Insper afirma que a “Grande Renúncia” – “É um fenômeno multissetorial, em um nível muito mais alto de desligamento voluntário, reportado pelas áreas de Recursos Humanos. O que diferencia este momento de outros passados, nos quais houve esses movimentos de turnovers mais altos, é que um percentual significativo dessas pessoas que asíram não tem qualquer posição em vista. Ou seja, elas não estão simplesmente mudando de trabalho”.

Certamente, muitas explicações estão surgindo e outras irão surgir para delinear um pouco do que o movimento “grande renúncia” quer expressar. No entanto, alguns fatores já nos fazem pensar enquanto gestores, diante desse quadro; um deles é que a força de trabalho chega de certa forma à exaustão com as jornadas “ininterruptas” estendidas pelo uso dos canais alternativos de tecnologia que vão, além dos e-mails e do tempo habitual da jornada – invadindo os fins de semana. E, nesse sentido, muitas pessoas/profissionais vêm se questionando sobre o que de fato querem e não querem para suas vidas, pois, não somos as mesmas pessoas e não temos os mesmos comportamentos e preferências de dois anos atrás…

Para algumas pessoas a ressignificação da vida frente à vulnerabilidade humana vivida na pandemia, fez com que, nem mesmo os altos salários, sejam um atrativo para a sua permanência nas empresas. É chegado, pois, o tempo de alinhar trabalho e propósito e, esse pressuposto, torna-se um dos elementos mais significativos para os gestores, onde o “recativar” cada colaborador, pode ser a chave inicial para uma remodelagem dos nossos processos gerenciais e do desenvolvimento dos profissionais – num desenho de um novo pacto profissional – onde o fazer esteja alinhado com o ser. Como afirma o professore e filósofo Leandro Karnal, e ser é… “ser percebido. E a maneira como percebo as coisas é tentar fazer esta vida ser significativa.”

 

               Amaro França

Gestor educacional, escritor, palestrante e Diretor Executivo do Colégio Sagrado Coração de Maria

 

Referências:

CORTELLA, M. S. & KARNAL, L. Viver, a que se destina? São Paulo: Ed. 7 mares, 2020.

 

FRANÇA, A.L.S. Gestão Humanizada: liderança e resultados organizacionais. Belo Horizonte: Ed. Ramalhete, 2019.

 

INSPER. FENÔMENO DA GRANDE RENÚNCIA. Disponível em:  https://www.insper.edu.br/noticias/o-fenomeno-da-grande-renuncia-exige-que-as-empresas-repensem-o-trabalho/ Acesso em 05 de maio. 2022.

 

LÜCK, H. Liderança em gestão escolar. Petrópolis-RJ. Ed.Vozes,2008.

 

PORTAL REVISTA FAMÍLIA CRISTÃ. Disponível em: https://revistafamiliacrista.com.br/ Acesso em 05 de maio. 2022.

 

STERN, S. & COOPER, C. Mitos da gestão: descubra por que quase tudo que você ouviu sobre gestão é mito. São Paulo: Ed. Autêntica, 2018.




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