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Publicado em 06 de março de 2012 | 10 minutos de leitura

Os desafios do ensino de Inglês no Brasil

As distâncias físicas continuam as mesmas. No entanto, o desenvolvimento de novas tecnologias de comunicação nos últimos anos vem aproximando cada vez mais nações distantes geograficamente. O fenômeno, conhecido como globalização, faz com que o mundo possa ser comparado com uma pequena aldeia, onde é todos sabem o que acontece pouco depois do ocorrido. No entanto, como existem diversos idiomas, para haver comunicação e aproximação, de fato, entre os povos, é necessária uma linguagem em comum. Atualmente, a língua tida como universal é a inglesa. Muito utilizado em negociações políticas e tratados comerciais entre países e empresas multinacionais, o Inglês deixou de ser um diferencial e tornou-se pré-requisito para as melhores vagas oferecidas no mercado de trabalho. No Brasil, soma-se à isso a realização de eventos de grandes proporções, como a Jornada Mundial da Juventude, em 2013, a Copa do Mundo de futebol, em 2014, e os jogos olímpicos, em 2016, no Rio de Janeiro.

Pensando em desenvolver o ensino da língua inglesa no país, o British Council, uma organização internacional do Reino Unido, que tem como um de seus objetivos estabelecer a troca de experiências, inclusive na educação, entre seu país de origem e os mais de 100 onde atua, realizou, nos dias 1º e 2 de março, o I Fórum de Língua Inglesa como Política Pública. A intenção era reunir líderes governamentais, educadores e pessoas ligadas à área para discutirem projetos que viabilizem o acesso à língua por pessoas com diferentes tipos de rendimento. Segundo a organização, menos de 5% da população brasileira têm inglês fluente e a estimativa é que a procura pelo aprendizado do idioma cresça até 40% nos próximos quatro anos devido à proximidade dos eventos. Desafio: despertar no aluno o interesse por outros idiomas – Durante o encontro, foi lançado o programa de pesquisa English Next Brazil, desenvolvido pelo linguista e pesquisador britânico David Graddol. A pesquisa, realizada anteriormente na Índia, vai analisar fatores demográficos e tendências econômicas, apontando como podem influenciar políticas públicas para o ensino de língua inglesa. De acordo com o especialista, o mundo inteiro procura novidades na educação, e o Inglês faz parte disso. Para ele, a estratégia de encher a cabeça das crianças com competências e habilidades para a vida toda está desgastada. “Precisamos focar na autonomia do aprendizado ao longo da vida e desenvolver a fluência linguística. Atualmente, o ensino do Inglês é bastante dependente do professor. Acredito na necessidade de incentivar a autonomia e o interesse do aluno em aprender”, afirmou.

David Graddol disse que o idioma tem sido parte central de reformas educacionais em vários países, desde o início da década de 90. Para tornar o aprendizado mais eficaz, o especialista acredita em três pilares fundamentais: o treinamento dos professores, a motivação dos alunos e o que acontece fora da escola. “É impossível querer que tudo aconteça somente         dentro de sala. É preciso dar exposição e familiaridade com a língua”, disse. Com a proximidade dos grandes eventos, que têm repercussão mundial, e a necessidade em aprimorar o Inglês dos brasileiros, surge um questionamento importante: existe tempo hábil para uma melhora rápida? De acordo com Jim Scarth, diretor da British Council no Brasil, os resultados mais efetivos só começam a aparecer entre 10 e 20 anos, depois de duas ou três gerações. Porém, é possível ensinar o idioma de maneira específica, voltado para facilitar a recepção dos turistas. “Podemos treinar, por exemplo, policiais, taxistas e atendentes nos estádios. Eles não precisam ter um Inglês perfeito. Um vocabulário restrito, para atender algumas necessidades, já é o suficiente. Só precisamos pensar qual é o foco, centralizar em conversas curtas e objetivas, para que as pessoas sejam capazes de dar informações básicas aos visitantes”, destacou o especialista, afirmando que cursos de um ou dois anos podem apresentar resultados práticos, mas não são suficientes para que o nível da população seja considerado bom. “Ainda há muito para ser feito. Porém, o mais importante é desenvolver o ensino da língua nas escolas públicas. As particulares são boas, mas são apenas para as classes mais privilegiadas”, completou.

O que é preciso fazer para ampliar o acesso à língua inglesa? – “Em primeiro lugar, precisamos ter a consciência de que estamos vivendo em um mundo globalizado. Dentro disso, o Brasil se destaca como grande potência econômica e, por isso, em suas relações comerciais e políticas, necessita do Inglês, que é a língua da globalização. Necessitamos de políticas públicas voltadas para o ensino do idioma para o povo brasileiro, dando ênfase, principalmente, na oralidade. O trabalho precisa começar nas escolas. Apesar de ainda não termos muitas políticas para isso, já há indicadores sobre essa necessidade.” Francisco Prim, coordenador pedagógico da Secretaria Municipal de Educação de Goiânia

“Acho que a língua inglesa tem uma importância muito grande em dois sentidos básicos. O primeiro é em relação ao nível do indivíduo, de formação pessoal, já que expande os horizontes culturais, educacionais e humanos. Além disso, sob o ponto de vista do país, é fundamental no desenvolvimento das áreas de ciências tecnológicas. Isso é primordial para a inserção definitiva do Brasil no mundo das competições econômicas e políticas tão acirradas como é atualmente.” Marcelo Embiruçu, pró-reitor de Pesquisa da Universidade Federal da Bahia. “Para você se comunicar com o mundo e ter acesso a determinadas informações que circulam internacionalmente, é necessário ter conhecimento sobre a língua inglesa. Entretanto, é importantíssimo que isso não fique limitado apenas às elites. Precisamos estabelecer políticas públicas para que todos, inclusive as classes sociais menos favorecidas, aprendam, ao contrário do que acontece historicamente, ficando restrita a           pequenas parcelas da população. Nosso maior desafio é proporcionar o aprendizado do Inglês de maneira democrática.” Sávio Siqueira, professor da Universidade Federal da Bahia

 

“O Inglês abre a possibilidade de ascensão social e desenvolvimento acadêmico, especialmente em um país como o nosso, que está crescendo e adquirindo um papel cada vez mais importante no cenário mundial. Por isso, acho importante que as pessoas tenham a oportunidade de aprender o idioma e serem incluídas nesse processo, independente de sua classe social. Um país com uma boa parcela de falantes da língua inglesa, em última análise, é capaz de obter maior desenvolvimento, pois possibilita uma comunicação mais fluente no mundo, impulsionando negociações mais eficientes e menores custos em determinadas iniciativas.” Sérgio Silva, presidente da Associação Brasileira de Culturas Inglesas. Rio é uma das poucas redes que têm política para o Inglês – Apesar da demanda e das perspectivas de que o conhecimento da Língua Inglesa será cada vez mais necessário no curto e médio prazo, são poucas as secretarias de Educação que têm projetos estruturados para ensino da disciplina. Nas redes municipais, que se ocupam do ensino fundamental, onde a língua estrangeira não é disciplina obrigatória, ações nessa linha são ainda mais raras. Um dos exemplos que seguem na linha contrária a esse quadro é a cidade do Rio que, motivada pela demanda decorrente dos Jogos Olímpicos de 2016, já deu o pontapé inicial para tentar desenvolver a fala da língua inglesa em suas crianças. Desde 2010, o município realiza, através da Secretaria Municipal de Educação (SME), o programa Rio Criança Global, que consiste em introduzir o ensino do idioma desde o 1º ano do ensino fundamental. Desde o início do projeto, os alunos do 1º ao 4º e 6º anos têm dois tempos semanais de Inglês, com ênfase na conversação. Em 2012, os estudantes do 5º e 7º anos também foram inseridos, totalizando 400 mil alunos beneficiados. A partir de 2013, os jovens do 8º ano serão atendidos e, em 2014, será a vez do 9º ano.

“Não podemos exigir que, apenas com isso, eles sejam fluentes na língua, mas dá um empurrão em direção ao aprendizado e constrói um caminho para que, no futuro, possamos ampliar a produção deles no Inglês”, comentou a secretária Claudia Costin, durante o Fórum. A ideia, segundo a secretária, é possibilitar que as crianças possam ser anfitriãs dos jogos, se comuniquem em outro idioma e aumentem sua empregabilidade. De acordo com ela, todos precisam ter acesso ao idioma, ampliando o que chamou de cidadania global. “Estamos tentando colocar o Inglês como política pública. A dificuldade é grande, mas o entusiasmo também. Vivemos uma reforma educacional no Rio e o Inglês não é algo a mais, é parte integrante”, disse, lembrando que os jovens que estudam em instituições de elite têm acesso ao Inglês desde a infância.

Folha Dirigida, 06/03/2012 


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